sábado, 30 de abril de 2011

O Labirinto e o Tempo - Parte 3

A meditação caminhando no Labirinto é também uma peregrinação. A peregrinação aos lugares santos é também uma meditação. O peregrino é alguém que caminha em uma estrada com um fim determinado e, a princípio, com uma finalidade determinada. Essa finalidade determinada pode ter variações, ou mesmo mudar ao longo do caminho. Eventualmente a peregrinação pode até mesmo ser vencida pelo cansaço, para aquele que busca algum ganho concreto nesse peregrinar, como, por exemplo, se estiver aí com um espírito de competição, dizendo: "se todos estão fazendo isso, então eu também tenho que fazer". Esse tipo de interesse pode ser um começo de aproximação de uma atividade liberadora ou inovadora para o indivíduo, mas tem também possibilidade de tornar-se frustrante. Aquele que "se dispuser ao caminho", que quiser mais aprender com o caminho, do que tentar submetê-lo aos seus próprios ganhos, pode vir a enriquecer sua finalidade de peregrinar, ou até mesmo descobrir novas finalidades. Neste aspecto também pode entrar "o tempo". Uma das características do homem moderno é querer controlar o tempo, dominar o tempo. Essa característica pode estar presente naquele que inicia uma peregrinação. Não é fácil desfazer-se dos apegos ao entrar em um caminho diferente. Também por isso que retiramos os sapatos para caminhar no labirinto. Os sapatos carregam a aceleração das horas do dia nas ruas e corredores do trabalho. Os pés sem sapato no labirinto procuram revalorizar o repouso de um corpo com menos amarras.
O peregrino que caminha em desapego respeita o tempo marcado pelo trajeto, que impõe paradas e continuações. Aquele que anda no labirinto em desapego sente até mesmo ganhar tempo ao ganhar energia, tempo esse que não exatamente o tempo do relógio, mas são reservas de tempo interno que poderá levar consigo ao sair do espaço labiríntico.
Isso não quer dizer que não se possa adentrar ao labirinto com uma pergunta, um anseio, uma busca, mas deve-se deixar o caminho demonstrar as respostas, os novos trajetos na vida, em uma nova vivência do tempo cotidiano.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

O Labirinto e o Tempo - Parte 2

A mudança da percepção de tempo na caminhada pelo labirinto está ligada à mudança de percepção do espaço. Inicialmente a pessoa adentra seu corpo em um espaço que de antemão já nota ser um espaço circular. Em um primeiro momento, a impressão de "todo" e de "uno" do espaço circular pode sugerir a ideia de "disposição facilmente resolvida" do corpo na simplicidade do contorno definido. No entanto, a necessidade de prosseguir no caminho estreito e sinuoso dirige o olhar para baixo e desloca o corpo em deslocamentos acompanhados de sucessiva perplexidade com as inovações das curvas e dobras que se apresentam sucessivamente. O espaço torna-se complexo, inusitado, condutor de nossos passos a sentido e direção diferentes do que nossa "noção de equilíbrio" desejaria fazer. Assim, no desdobramento do espaço, desdobra-se também o tempo. O labirinto torna-se então uma espécie de mapa de uma dimensão diferente de mente e corpo. Juntando espaço e tempo, une também mente e corpo em um processo relocador de nossa atenção outrora focada no estresse do cotidiano e desfocada do presente, sempre colocando-se em um hipotético "futuro com soluções". A nova percepção de tempo do labirinto na verdade acompanha-se de um foco de atenção dirigido "ao presente" dos movimentos. Paradoxalmente, esse foco no presente conjuga-se com um revivenciar da peregrinação simbólica no labirinto medieval. Nesse espaço, presente e passado harmonizados conjugam energias para o futuro reunidas na fase de "restauração", no caminho de volta do labirinto.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

O Labirinto e o Tempo

O tempo vivido pelas pessoas da Idade Média era marcado de forma diferente do "tempo moderno". Pode-se dizer que eram "diferentes vivências de tempo". Até certa altura da História, o tempo era marcado pelas variações da natureza, ou mesmo pelas horas de oração. Conforme o estudioso Jacques Le Goff, em 1284, na cidade de Florença, o sino passa a marcar também a hora de início e fim do trabalho. Ainda segundo ele, setenta anos depois, ou seja, em 1354, esse sino é substituido pelo relógio da torre, com essa função. Le Goff cita autores que consideram essa uma passagem de um "tempo religioso" (podemos dizer também "sagrado") para um tempo profano, ditado pelo trabalho.
Gimpel, estudioso das construções das catedrais medievais, refere como uma conquista dos engenheiros e técnicos da Idade Média a construção do relógio mecânico musical de Beauvais entre 1300 e 1321 (segundo ele o mais antigo do mundo). Gimpel também cita o médico e astrônomo italiano Giovanni di Dondi que construiu um relógio astronômico em Pádua, entre 1348 e 1360.
Temos aí, então, datas entre 1284 e 1360. Essas datas são aproximadas (num intervalo um pouco mais amplo) daquelas já citadas como sendo entre o ano de 1277 e a década de 1310, em período correspondente ao fim do auge do Gótico. Vemos assim essa época de transição entre a perda da vivência de um "tempo sagrado", para o início da vivência de um "tempo profano", mais pragmaticamente ligado ao cotidiano de trabalho exterior, com menos ênfase ao "tempo do interior do ser humano".
Ora, uma das percepções mais comumente citadas com a meditação caminhando no labirinto é a "perda de noção do tempo", "impressão de tempo dilatado", e outras similares.
Talvez o labirinto tenha mantido "guardado dentro dele" aquele "tempo sagrado" dos antigos, que era menos ditado pela correria do dia a dia, e mais orientado pela natureza enquanto espaço da sacralidade. Assim, a atividade no labirinto pode recuperar a noção perdida de um tempo mais profundamente ligado à alma humana e de um tempo cósmico.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Auge da Arte Gótica

Conforme Gimpel (e outros estudiosos) o período de auge da Arte Gótica teria sido entre a década de 1140 e a transição entre os séculos XIII e XIV (Há que se frisar que Gimpel prefere considerar o período cheio de 250 anos a partir de 1050, sem querer acentuar muito a diferença entre estilos românico e gótico).  No início desse período, ou seja a partir de 1140, as construções góticas teriam se iniciado principalmente a partir do Abade Suger de Saint Denis na França. O Abade Suger é uma personagem interessante para entender-se a complexidade desse momento histórico e mudar-se a noção simplista de que a Idade Média era um período apenas de ignorância e domínio de poderosos sobre comandados e imobilidade social. Suger foi um indivíduo filho de servos, que foi acolhido na escola monástica e posteriormente adquiriu lugar de destaque na sociedade, ao lado da realeza. Sempre foi grato a essa oportunidade que a ele foi oferecida. Essa pode ser uma das explicações para ele ter uma postura mais do tipo festiva, exuberante, celebrante, na maneira de entender os rituais, diferentemente de São Bernardo, que tinha atitude mais austera no que diz respeito a esses quesitos. No entanto, ao mesmo tempo em que ambos discordavam, de certa forma, também se entendiam e se toleravam. 
Com o apoio do Abade Suger refina-se a arquitetura que vai lançar uma nova luz - no sentido literal e simbólico - para o interior das igrejas.
O final do "melhor tempo do gótico" é situado então a partir de 1277, com as condenações doutrinais do bispo de Paris lançadas ao Tomismo e ao Averroismo (o estudioso Pierre Duhem acha que essas condenações teriam estimulado o avanço científico por proibir essas formas de Aristotelismo).  Posteriormente essas condenações seriam anuladas, mas já teriam deixado suas marcas negativas. No início do século seguinte ocorreu a perseguição aos Cavaleiros Templários, que nos anos 1310 foram oficialmente suprimidos (mas não totalmente desaparecidos), em virtude da ambição de Felipe, o Belo, pelos bens templários. Há que se notar que em anos recentes foi descoberto o assim chamado "Pergaminho de Chinon", que tem sido considerado como documento que demonstra que os Templários não foram oficialmente condenados pela Igreja.
A Ordem dos Templários tinha grande importância econômica, política e social nesse momento e sua derrocada fechou essas décadas de transição para o declínio do Gótico.
Nesse período de aproximadamente 150 anos, os labirintos foram instalados no chão das grandes catedrais como um elo comum de ligação entre as mesmas.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Construções Medievais

Hoje em dia procura-se cuidar, preservar e restaurar construções históricas dos mais variados períodos da História. Mas, não foi sempre assim. E mesmo ainda nos tempos atuais se vê grande abandono de antigos imóveis e ruínas no Brasil.
Tratando mais especificamente das construções medievais, há algumas peculiaridades ligadas ao binômio destruição/preservação. As obras medievais, principalmente as consideradas como góticas, a partir de uma determinada época, que podemos identificar como de transição entre a Idade Média e o Renascimento (a partir de certa altura do século XIV), vão, aos poucos, ganhando um estranhamento dos cidadãos ao seu redor, principalmente por parte dos artistas e pessoas de estudo. Embora algumas construções góticas ainda adentrem esse período em obras, já com algumas modificações, a visão renascentista da "perspectiva", da "correção anatômica" que bebe em fontes clássicas, tornam "ilegível" a arte gótica ao indivíduo do Renascimento. A objetividade da busca das "medidas corretas" e "proporções adequadas" fez com que se perdesse a percepção da "arte simbólica" do período gótico. Com esse estranhamento, o homem do período assim chamado Humanista passou a considerar a arte gótica como uma "arte feia", assimétrica, desporporcional, longe da beleza clássica. Com isso, houve um gradual esquecimento e abandono dessas obras.
No século XVIII, o espírito racionalista e prático adentrou também a maneira como os próprios religiosos viam seus templos. Desse modo, a certa altura desse período, em uma determinada igreja da França, como a porta principal atrapalhava a passagem de ornamentos e santos carregados em procissão, o sacerdote responsável pelo local mandou que fosse ampliada tal porta, quebrando, assim, uma obra com séculos de idade.
No século XIX, tal abandono começou a ser revertido com o movimento do Romantismo, que buscava as origens culturais europeias, tendo-se acentuado um respeito pelas obras medievais, a partir da constatação de sua própria situação de certa possibilidade de ruína, principalmente a partir de eventos como o incêndio da Catedral de Chartres de 1836. A partir daí diferentes indivíduos chamaram a atenção para essas construções, um deles o grande escritor Victor Hugo pelo lado da literatura, e o arquiteto Eugène Viollet-le-Duc, que, embora alvo de polêmica por causa de suas intervenções, iniciou um processo de estudos e restauração das obras medievais.
Talvez, se não fosse por esses e tantos outros que mudaram a visão da sociedade sobre as construções góticas, hoje haveria modernos edifícios e igrejas soterrando os labirintos, impedindo-nos de conhecer esses portais do simbolismo e do inconsciente.   

domingo, 17 de abril de 2011

As catedrais e os labirintos

Além do Labirinto da Catedral de Chartres, outras catedrais medievais também tinham essa imagem em seu solo. Esses desenhos surgiram multiplicadamente nesse período, acompanhando todo um movimento cultural e artístico na Europa.
Conforme Jean Gimpel no livro "Les Bâtisseurs de Cathédrales" (Os construtores das catedrais) (1980), no espaço de 3 séculos, entre 1050 e 1350, a França extraiu milhões de toneladas de pedras para edificar 80 catedrais, 500 grandes igrejas e algumas dezenas de milhares de igrejas paroquiais. A França carregou mais pedras nesses 3 séculos do que o antigo Egito (ao menos nos cálculos de 1980, ano desse livro; desde então houve outras descobertas arqueológicas no Egito, mas não sabemos se há algum novo cálculo similar a esse respeito).
Ainda conforme Gimpel as fundações das grandes catedrais adentraram 10 metros de profundidade, ou seja, no nível médio de uma estação de metrô de Paris; formam uma massa de pedra tão considerável quanto a que se encontra na superfície.
Relata esse autor também que na Idade Média havia uma igreja ou capela para cada 200 habitantes em média. A catedral de Amiens, com 7700 metros quadrados permitia que toda a população da cidade, ou seja dez mil habitantes, assistisse uma mesma cerimônia.
Um edifício que fosse construido até a altura da torre mais alta da catedral de Chartres deveria ter em torno de trinta andares. Em relação à catedral de Estrasburgo chegaria a 40 andares.
Ora, toda essa grandeza faz com que se questione a ideia que ainda muitos têm da Idade Média como um período dominado apenas por obscuridades, guerras e outras calamidades. A construção de tais obras, ao mesmo tempo cheias de grandiosidade e de muitos detalhes, em uma época em que não se tinha toda a tecnologia de hoje faz-nos pensar no tempo, reflexão, elaboração e esforço despendidos para toda essa realização.

Meditação Caminhando na Embraer

ATIVIDADE DA "MEDITAÇÃO CAMINHANDO NO LABIRINTO" OCORRIDA NA EMBRAER EM MARÇO DE 2011; MOMENTOS ANTES DO INÍCIO.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Meditar no Labirinto: A Catedral de Chartres e o Labirinto

Meditar no Labirinto: A Catedral de Chartres e o Labirinto: "O desenho de labirinto que utilizamos mais frequentemente para meditação é baseado no Labirinto da Catedral de Chartres, na França. A const..."

A Catedral de Chartres e o Labirinto


O desenho de labirinto que utilizamos mais frequentemente para meditação é baseado no Labirinto da Catedral de Chartres, na França. A construção “mais recente” da Catedral e que contém o Labirinto foi feita de 1194 a 1120, ou seja, 26 anos. Para as dimensões dessa obra e para a época, esse pode ser considerado um tempo recorde. No ano de 1194, houve um incêndio que consumiu a igreja anterior, de modo que foi necessário construir outra. Há autores que cogitam a possibilidade de tal incêndio ter sido até intencional para proceder-se à nova obra; tal hipótese foi formulada em virtude das partes que teriam sido preservadas do fogo. O projeto da “nova” catedral, indica que a posição do labirinto foi situada no lugar da porta da antiga igreja. Assim o labirinto deveria separar o espaço profano do espaço sagrado. Se observarmos bem, em muitas igrejas há um espaço similar, em geral um retângulo cujo comprimento fica perpendicular à nave principal da igreja. Eventualmente nesse espaço há ornamentos ou obras artísticas que evocam o mundo material. Também nesse espaço às vezes ficam as pias de água benta, para que o fiel adentre ao espaço sagrado após benzer-se com essa água. Há muitos detalhes a respeito da magnífica Catedral que enriquecem o sentido simbólico do labirinto. Ela fica localizada sobre restos arqueológicos de outras igrejas, ou mesmo de um templo romano, ou ainda acima também de um poço druida, que ainda pode ser visto ao visitar-se a cripta da catedral. Assim, esse labirinto conecta-se com uma série de outros elementos simbólicos que despertam arquétipos de nosso  inconsciente coletivo. Vamos aos poucos relatar alguns dos aspectos interessantes da Catedral de Chartres.  

segunda-feira, 4 de abril de 2011

O labirinto como desafio

Atravessar o umbral que separa o labirinto do mundo exterior pode ser um desafio para o caminhante. Depois de iniciados os primeiros passos há o desafio da crença de que vale a pena prosseguir. Essa crença implica em certa esperança, embora haja a indefinição do trajeto que está por vir. As dobras e aparentes retornos são também um desafio à paciência, ao relaxamento, à espera. São três substantivos desprezados no mundo da velocidade pela aquisição, pela produção, pelo sucesso, pelo resultado. É difícil dizer qual é o desafio maior: se o do labirinto em si como um caminho-armadilha, ou se o do desligar-se do mundo da correria. Este último é menos aparente, menos lembrado, menos acentuado. É mais fácil pensar-se no labirinto como algo que está alí para ser uma espécie de jogo ou de truque. Mais difícil é achar que pode ser uma ferramenta, um instrumento de quebra da rotina, um espaço sagrado que permita uma pausa na vida acelerada e competitiva, a qual acaba por gerar imperceptíveis desdobramentos de mal-estar, de sintomas e mesmo de moléstias. O desafio do labirinto pode ser, assim, também um exercício que exija um esforço interior tal qual o esforço necessário ao desafio aeróbico que exige inspirações, expirações, suor e concentração.